Lembro-me do dia em que o conheci como se fosse ontem. Lembro-me que era uma tarde quente de agosto, tal como tinham sido todas as outras tardes daquele Verão. Lembro-me bem que ele estava todo vestido de preto e que não sorria uma única vez. O seu olhar parecia implorar por ajuda como se ele tivesse todos os problemas imagináveis no mundo e ninguém com quem os partilhar. A maneira como ele andava, com os ombros descaídos e os olhos no chão, enquanto chutava as pedras no caminho, fazia-me pensar no que lhe teria acontecido.
De alguma maneira, esse rapaz de ombros descaídos e todo vestido de preto em pleno agosto entrou na minha vida. Na altura, nunca pensei que ele me fosse mudar completamente. Ele parecia tão calmo, inocente e inofensivo. Tudo o que eu queria fazer era ajudar aquele rapaz que tinha perdido o seu caminho. Mas, com o passar do tempo, apercebi-me que não era eu que ia ajudar o rapaz vestido de preto. Era ele que me ia ajudar a mim. Era ele que me ia ensinar aquilo que eu antes nunca quis aprender. Era ele que me ia mostrar o que nunca consegui ver.
Com o passar do tempo, estávamos mais próximos do que alguma vez imaginei. Eu sabia tudo sobre ele, menos os seus problemas. Essa era a única coisa que ele nunca me dissera e, sinceramente, nunca tive a necessidade de saber.
Eu sentia-me repleta de felicidade quando estava na sua presença, mas o rapaz vestido de preto não parecia sentir o mesmo. Por volta de novembro, fechou-se de todos que se importavam com ele, incluindo eu. A sua cabeça, que tinha andado erguida nos últimos meses, estava novamente baixa. O seu olhar, que tinha ganhado um certo brilho, estava repleto de problemas e preocupações mais uma vez.
Era como se, agora, o rapaz vestido de preto não fosse nada.
Quando eu pensava que ia esquecer aquela tarde de agosto e todos os momentos depois disso, ele entrou novamente na minha vida como um furacão. Depois de meses sem uma palavra sequer, o rapaz vestido de preto ligou-me. Assim, do nada. Apenas um toque e nada mais. Ter-se-ia ele se arrependido da ligação e simplesmente desligado antes que eu pudesse atender?
Mesmo assim, quando recebi a chamada dele, era como se as minhas pernas se mexessem sozinhas. O vento que me batia na cara enquanto corria rua fora era, de certeza maneira, reconfortante.
Não me surpreendi ao encontrar a porta de casa dele aberta. Ele sabia que eu viria. Corri o máximo que as minhas pernas permitiam na direção do quarto do rapaz vestido de preto. E lá estava ele.
Pendurado no tecto, com uma corda à volta do pescoço e um banco caído por debaixo dos seus pés. Os seus brações estavam caídos de cada lado do seu torso, em sinal de derrota, a cabeça mais baixa do que nunca, os seus ombros capazes de chegar ao chão… Mas o seu rosto… O seu rosto estava tão sereno, calmo, inocente e, acima de tudo, em paz.
Mas o que mais me surpreendeu não foi a sua expressão facial, mas sim o facto de ele estar todo vestido de branco. Branco da cabeça aos pés. O rapaz vestido de preto era agora o rapaz vestido de branco. O rapaz vestido de preto estava morto, mas o rapaz vestido de branco tinha começado agora a viver.
E, de repente, o rapaz vestido de branco era tudo novamente.
Lara Soares, 11ºG.
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